A Fundação Cesgranrio — atual responsável pela
aplicação de vestibulares, concursos e avaliações como o Exame Nacional
do Ensino Médio (Enem) e o Exame Nacional de Avaliação do Desempenho dos
Estudantes (Enade) — está iniciando um projeto de elaboração de testes
adaptativos por computador para concursos de larga escala. O sistema,
que já é utilizado em alguns exames dos EUA, tem como principal premissa
a realização de provas 100% informatizadas, nas quais os limites das
habilidades e competências de cada estudante são levados em consideração
o tempo todo durante o teste.
Para elaborar o projeto, a
Cesgranrio se baseia no método desenvolvido na Faculdade de Psicometria
da Universidade de Cambridge, na Inglaterra. Segundo o professor Ruben
Klein, especialista em avaliação e consultor da fundação, a implantação
desse tipo de teste no Brasil promete revolucionar o conceito de
avaliação. Além de provas mais atraentes, com a possibilidade do uso de
recursos multimídia, como vídeos e músicas nos enunciados, a aplicação
dos exames em computadores diminuiria gastos com transporte, impressão e
logística, e acabaria com a necessidade de os exames serem realizados
em um único dia.
Entretanto, especialistas questionam a
viabilidade de se aplicar no Brasil uma prova de modelo adaptativo em um
futuro próximo. A Cesgranrio planeja utilizar o sistema em dois ou três
anos começando por avaliações com poucos alunos e evoluindo para uma
aplicação em larga escala.
Uma prova do tamanho do Enem
poderia ser feita no modelo adaptativo por computador daqui a quatro
anos, de acordo com as previsões de Klein. "No papel, é complicado fazer
uma prova adequada a todos. Se um aluno acerta todas as questões ou não
responde nada porque está muito difícil, você não está medindo bem as
suas habilidades. Pelo computador, nesse conceito adaptativo, de acordo
com as respostas marcadas pelo candidato, o sistema seleciona questões
mais apropriadas para as competências desse estudante. O nível de
dificuldade das perguntas seguintes varia segundo o desempenho dele em
cada item, e a nota é calculada pela Teoria de Resposta ao Item (TRI),
que considera se o aluno fez uma prova mais fácil ou difícil. A ideia é
ter um diagnóstico preciso das deficiências de cada estudante nas
habilidades analisadas" explica o consultor.
"Em até quatro
anos, poderemos utilizar o modelo no Enem. No entanto, para a
implementação do projeto numa avaliação como o Enem, três pontos
precisam estar muito bem ajustados: em primeiro lugar, é preciso montar
um banco de questões robusto, capaz de sustentar provas diferentes para
milhões de estudantes (neste ano, cerca de 4 milhões fizeram o exame);
as técnicas da TRI devem ser transparentes para toda a população e muito
precisas para evitar injustiças; e o ambiente virtual de aplicação dos
testes deve ser blindado contra o ataque de hackers".
O
professor Leonardo Cordeiro, mestre em matemática pura e aplicada pelo
Impa, vê com desconfiança os planos da Cesgranrio. "Os exames do
Scholastic Assessment Test (SAT), dos Estados Unidos, que são muitas
vezes comparados ao Enem, não usam as provas adaptativas por computador.
O modelo lá é usado em diversos exames. Mas, na prova que tem objetivo
parecido com o nosso, com uma quantidade relevante de candidatos, não é
utilizado. Então, devemos questionar por que isso seria feito no Brasil.
Se fosse para ser uma tecnologia só para avaliação, tudo bem, mas
quando a gente fala de um teste que vai selecionar para as principais
universidades públicas, é preciso muito cuidado. As técnicas da TRI
ainda são uma caixa-preta para a grande maioria da população. A
tecnologia adaptativa seria a caixa-preta da caixa-preta", afirma
Cordeiro.
Para o professor de redação Bruno Rabin, diretor
do colégio e curso _A_Z, o modelo traria vantagens se fosse aplicado com
precisão, o que ele acha difícil ocorrer em menos de 15 anos. "Os
testes adaptativos têm muitas vantagens, como a possibilidade de fazer a
prova em diferentes datas, uso de material multimídia etc. O modelo é
interessante. Mas o Brasil não tem tradição cultural para metodologias
quantitativas de avaliação. Uma prova adaptativa exige precisão.
Qualquer erro será replicado e, em se tratando de uma seleção, pode
causar injustiças", pondera o professor.
O projeto em
elaboração pela Cesgranrio também tem o objetivo de, a partir da
construção de um grande banco de itens, disponibilizar questões para
provas escolares em todo o ensino básico. Segundo o consultor Ruben
Klein, seriam dois bancos distintos, um para ser usado no ensino e outro
nas avaliações. Arnaldo Willian Pinto, diretor pedagógico de educação
básica da Pearson — empresa de soluções em educação — comemora a
notícia: "O professor ter acesso a uma plataforma que permitirá
diagnósticos mais contínuos na escola é muito bom. É muito mais
eficiente conhecer a proficiência dos alunos nas habilidades do que
dizer que ele não é bom em matemática ou em português". Agência Globo
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